quarta-feira, 18 de abril de 2018

Sou um lixo, mas peço desculpas


Li hoje que a “magistrada” Marília Castro Neves – que se destacou mês passado por suas parcas & porcas ideias sobre Marielle Franco – veio a público novamente, com um pedido de desculpas à professora Débora Seabra. A detestável Castro Neves ofendeu a professora, que tem Síndrome de Down. Anteriormente, ela já havia criticado o Dia da Consciência Negra, a Lei Maria da Penha e o deputado federal Jean Willys.  Seus comentários não são poucos, não datam de ontem e recebem muitos likes e aplausos.

Investigada pelo Conselho Nacional de Justiça, a potestade das trevas então se desculpa. Diz ter sido “precipitada”, espalhou merda na cara do mundo sem verificar a natureza do conteúdo, blablablá, “me desculpe, não desejo mal a ninguém, obrigada por ter me ensinado ...”. Tá. Tendo em vista a investigação do CNJ, ela produziu uma prova pública de arrependimento. Só isso.

Mas tem quem acredite em pedidos de desculpas “sinceros” e públicos, do tipo “aprendi a lição, nunca mais faço”. Como se fossem o objetivo final de uma história como essa. Desse modo, uma gente intolerante continua destilando ódio fantasiado de opinião. Quando pegos em flagrante, posam de paladinos da honestidade, levados ao erro por precipitação, pelo calor do momento, pelos comentários de amigos. Sempre por outra coisa que não a própria vontade, a própria intolerância. Alguns passam a acreditar nas próprias balelas, repetidas tantas vezes e com argumentos tão cidadão-de-bem, palavras tão lapidadas, expressões tão combinando com o almoço em família.  

Essas atitudes me fazem lembrar do documentário I Am Not Your Negro (Raoul Peck/ EUA, 2016), sobre o ensaísta e poeta James Baldwin. A certa altura, fala-se sobre a intolerância que a sociedade americana parece gostar de alimentar, ao mesmo tempo que cultiva a ideia de simplicidade e sinceridade. Ou seja, as pessoas dizem e compartilham as maiores barbáries, as ideias mais rasteiras sobre o mundo e os outros, mas tudo bem, elas se desculpam “com sinceridade”. Se mostram simples, quase ingênuas, não compreendendo o porquê de tanto barulho. 

Reforça-se, assim, uma imaturidade na qual ninguém precisa se conscientizar, aprender, sofrer, se questionar. Basta vir a público, simples e sincero. Sua intolerância será perdoada. “Não fiz por mal...”. Compreendida. Abraçada. Ódio e desprezo passam por opiniões apenas. Nada a se preocupar. Sorriam todos. Está tudo bem.