quinta-feira, 26 de maio de 2016

Quanto pior... pior



































Nesses últimos dias, dá a impressão de que “quanto pior, melhor”. Aquele tipo de coisa que catastrofistas na virtuália passam o tempo a postar, conjurar, dizer que antes não tinha nada disso, e que se fosse lá em casa, levava uma camaçada...

Mas o fato é que não tem como fingir que não acontece; “focar” em temas mais urgentes; evitar para não se deprimir. Está aí. Vejo agora meus coleguinhas da facul, com seus 20 e poucos, numa revolta sem fim (com razão, é claro). Muitas e muitos expondo todo o nojo que sentem pelo estereótipo do masculino. Outras e outros cobrando de seus amigos uma atitude, um post que seja, a condenar o fato. Umas e uns querendo saber o porquê do silêncio.

Enquanto isso, tem quem ache um exagero; que não é bem assim e que as generalizações não ajudam. Não, não ajudam. Mas acredito que o sentimento que sustenta essa grita é a recusa em aceitar que determinadas explicações sobre o mundo recebam sobrevida, dia após dia. Falo da recusa em aceitar certas naturalizações, como aquela que ensina às meninas como evitar um estupro; como e quando sair à rua para não chamar a atenção de um possível estuprador; da explicação que se dá às meninas sobre impulsos masculinos que, uma vez liberados, não têm volta – logo, não provoque, não teste, não libere sua curiosidade. Tema, desconfie, “se preserve”.

Não acredito que o problema esteja na pornografia em sua essência – está na cultura da violência, do exibicionismo, do machismo em imagens, textos, famílias, escolas, igrejas, discursos oficiais, decisões legislativas. E pior, em momentos de visibilidade da barbárie, a explicação sobrevoa o “desequilíbrio mental”. Descrições na imprensa falam em “suposições”. Dúvidas pairam, silenciosas, sobre o fato de uma menina estar na rua. Até tarde. Onde não deveria. Parece ser normal a existência do perigo, da agressão. Se a mulher permanece no espaço privado, isso não ocorre (o que não é verdade). Se ela se dispõe a circular em espaços públicos, ela mesma se torna pública e terá que lidar com isso. “Se não quiser que olhem, não se vista assim”; “se não quiser que passem a mão, não vá alí”; “se não quiser ser estuprada, que fique em casa”; “conseguir um homem é o ponto alto da sua vida”. As frases pronta-entrega passam a preencher o debate.

Como se fosse uma lei da natureza que jamais será modificada. Nessas horas, deixamos de ser seres racionais. Que podem transformar. Questionar. Passamos ao sempre foi assim. E falaremos em execuções sumárias. Em educação restrita (burcas?). Em mais religião. Por isso, entendo a revolta e a vontade botar fogo em tiozões que representam e reforçam esse patriarcado; é a resistência à ideia de inevitabilidade, ordem natural à qual devemos nos acomodar, nos adaptar. “Aceite, que dói menos”; “se for inevitável, relaxe e goze”. “Risos”. SQN.

Não aceite. Não aceite que é pulsão sexual masculina (natural, normal). Não aceite o papo sobre mulheres terem que se preservar (como? de quem? por que?). Não aceite lorotas machistas que nivelam tudo pela passividade/atividade. Não aceite estereótipos como formas naturais de vida (“coisa de viado”; “precisa desmunhecar tanto?”; “não na minha frente”; “tem que ser sexy, sem ser vulgar”). Não aceite opressão, precariedade, regra cagada, preconceito, violência como se fosse dado natural.

Por fim, é desesperador perceber que a tal da “ordem natural das coisas” só é citada quando se trata de injustiça social, de opressão de grupos e manutenção desta. Quando realmente se trata da “ordem natural das coisas” – por exemplo, desmatamentos, destruição, poluição em nome do bom e velho capitalismo de rapina – aí, se lança mão de termos como “progresso social”, “avanços”, “necessidade de mudanças estruturais”. Logo, há que se questionar. Se revoltar. Fazer barulho. Não aceitar. Isso sim é um caminho sem volta (felizmente).

Bonus track do inferno:


http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2016-05-25/fa-de-bolsonaro-alexandre-frota-apresenta-propostas-a-ministro-da-educacao.html

Em tempo: Alexandre Frota é aquele ex-ator, ex-modelo, ex-atleta, “empresário”, que já riu muito contando em entrevista na TV como estuprou uma mulher. Apresentador e plateia também riram e aplaudiram. u-hu. |Aqui|.