quarta-feira, 10 de junho de 2015

“Mas precisava ser tão vulgar?”

Dia desses, na facul, um cartaz – papel bobina desenrolado de um andar a outro. Pintada em várias cores berrantes, a frase “Eu não me visto para provocar a sua libido. O mundo não gira em torno do seu pau.”

Fotografado,  o cartaz apareceu nas tais redes sociais do arraial. À distância,  percebi o furor que causou. Ou melhor: a indignação. De pessoas lidas-estudadas, declaradas anti-machismo e etc. Ressaltavam a vulgaridade. Frisaram ser desnecessário algo assim, nesses termos. Alguns “analistas” sugeriram que “algo” deveria estar faltando a quem tornou público o pensamento.




E aí,  fiquei boquiaberta, me caíram os butiá dos bolso, como diz um amigo; no melhor estilo assaz e deveras. Pois aconteça o que acontecer, passe o tempo que passar, o padrão cueca de análise de mundo parece sobreviver sempre, e pior, nos meios mais improváveis. O da academia, por exemplo, onde ideias deveriam se apresentar, incomodar, fazer discutir. E o tal padrão parte igualmente de homens e mulheres.

Não vi comentários sobre o tema do cartaz, apenas sobre seus termos. Implicitamente, uma condescendência de olhos revirados, a dizer tá, a gente até concorda, mas precisava dizer assim?. Não acompanhei outros “debates” a respeito pra saber de outras reações. Mas pude constatar que o mais-do-mesmo tá na área, a repetir chavões do século passado, mesmo nas humanas e sociais (tá, inteligência não é apanágio das ciências humanas, mas poderia ser um bom objetivo a ser perseguido, né?).




Seja como for, nunca vi moçada se manifestando tanto quando ouve que “fulaninha é uma gostosa, eu comeria/pegava”, sentenciado tranquilamente, abertamente, entre pares, informalmente, “de boa”, numas de descontração. Ouço risos sinceros e engraçadinhos quando alguém diz que o que falta praquélali é “um desse tamanho”, frase que se faz acompanhar de um gesto que, provavelmente, o Brasil Colônia viu nascer. Dizer que falta a mesma coisa praqueleali seria nada a ver, não tem a mesma graça, não confundamos as coisas. A não ser que se queira “xingar” alguém de viado, aí vale, né?

Quédizê, a questão aqui não é que todos adotem puritanismos semânticos, nem que haja  castrações de machos em rituais “feminazis” (tem quem jure que isso existe). Apenas fazer perceber como ainda se reproduzem ideias que um dia definiram o que é vulgar em uma boca feminina (insira aqui seu trocadilho ou piada não vulgar... HAHAHAHAHA!), aquilo que não deveria  ser enunciado, ao menos, não desse jeito, né?. Tá.

E claro, moralistas são os outros. Machistas e pudicos idem. Fundamentalistas, igualmente.




É a tal história: debata a ideia, pessoa letrada e engajada. Não pare no que o seu julgamento considera vulgar. Discorde do que for, mas não use os mesmos padrões que considera abusivos ou ultrapassados para classificar algo. Por fim, o que exatamente está incomodando?

Bonus track Caso Verdade: no século passado, meu pai se convenceu de que eu não pararia de fumar. Fumante ele mesmo, quando se deu conta de que eu continuaria pagando pelos meus cigarros a hora em que quisesse, disse, com a “gravidade” que o tema exigia (!): “Só vou te pedir uma coisa. Não fume na rua. Ainda mais se estiver sozinha. Não pega bem.”

Porque coerência é fundamental, né?... Seja como for, tem dias em que tenho a sensação de que meu pai tem uns amigos espalhados em tudo o que é canto. Qualquer dia, tomam uma cerveja juntos. Juntos,  porque não pega bem falar de certas coisas quando mulheres estão presentes. Oras.